quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Desembargador critica defensores dos direitos humanos. Será mesmo?

Perambulando em minha TL, me deparo com a seguinte notícia:

"Desembargador critica defensores dos direitos humanos"

"Tenho uma sugestão ao professor Paulo Sérgio Pinheiro, ao jornalista Janio de Freitas, à ministra Maria do Rosário e a outros tantos admiráveis defensores dos direitos humanos no Brasil. Criemos o programa social "Adote um Preso". Cada cidadão aderente levaria para casa um preso carente de direitos humanos. Os benfeitores ficariam de bem com suas consciências e ajudariam, filantropicamente, a solucionar o problema carcerário do país. Sem desconto no Imposto de Renda.

ROGÉRIO MEDEIROS GARCIA DE LIMA é desembargador (Belo Horizonte, MG)"

A notícia foi repassada pelo blog "Faca na Caveira" e recebida por parte de seu público como uma "aprovação" de autoridades maiores na questão da violência policial.

O link original pode ser visto aqui: http://facanacaveiraoficial.com/desembargador-critica-defensores-dos-direitos-humanos/#

Existe um link da """notícia""" na Folha também, mas trata-se do "Painel do Leitor", onde leitores enviam suas notícias. O link segue abaixo:
http://www1.folha.uol.com.br/paineldoleitor/2014/01/1395677-desembargador-critica-defensores-dos-direitos-humanos.shtml

Pareceu-me bastante improvável que uma autoridade judicial de instância superior, de extensa carreira jurídica, fizesse uma "crítica" tão senso comum estilo Datena. Porque basta um pouco de conhecimento histórico e leitura da diminuta Carta de Direitos Humanos para que se pare com a equiparação  "defende DH = defende bandido". Dá pra notar que o que se defende, na Carta, é a Justiça, a condenação somente mediante processo, o amplo direito à defesa. É o que todo defensor de DH defende: A justiça e institutos consagrados. Se é razoável esperar essa compreensão de uma pessoa média que tenha lido a CDH e refletido sobre o assunto, é praticamente obrigatório esperar o mesmo de um bacharel de Direito, Advogado, Juiz, Promotor, Desembargador. Infelizmente não é o que ocorre. Frequentemente vejo vários colegas de Universidade proferindo o bordão "Direitos Humanos para Humanos Direitos", como se tal proclamação fosse exceção à regra e dotada de profunda reflexão. Não é. Só me resta lamentar pelo nível da educação e analfabetismo funcional e cognitivo, até em nível universitário, em nosso país.

Aí, "céticão" fui procurar sobre o Desembargador. Me deparo com seu curriculum (link abaixo) e estes livros, artigos, participações:

1- Constituição, Democracia e Desenvolvimento, com DIREITOS HUMANOS e Justiça. Curitiba: Editora Juruá, coord. Amini Haddad Campos, 2009; colaborou com o ensaio Direito e Economia e Corrupção.

2- Sistema de justiça, DIREITOS HUMANOS e violência no âmbito familiar. Curitiba: Editora Juruá, coord. Lindinalva Rodrigues Dalla Costa e Amini Haddad Campos, 2011; colaborou com o ensaio Acesso à Justiça e Direitos Fundamentais.

3- Participação no Programa de Aperfeiçoamento Judicial “Direitos Humanos – Sistema Correcional e Penitenciário”, UNICRI – United Nations Interregional Crime and Justice Research Institute, Campus das Nações Unidas de Turim, Itália - 12 a 16 de setembro de 2011.

Link: http://www8.tjmg.jus.br/institucional/desembargadores/curriculum/rogerio_medeiros_garcia_lima.html

Olha, que lindo. O ceticismo salvando o dia mais uma vez. Se antes me parecia improvável, resta agora quase impossível que um jurista autor de um livro intitulado "Constituição, Democracia e Desenvolvimento, com DIREITOS HUMANOS e Justiça." tenha feito uma """crítica"""" tão tosca, uma versão requintada do bordão "Tá com dó, leva pra casa", que é uma falsa dicotomia e um espantalho. Ninguém "tá com dó". Só queremos que se respeitem institutos jurídicos consagrados por 6.000 anos de história e evolução jurídica. Pela própria justiça e pelos inocentes que serão presos. Bandido bom é bandido preso, mediante processo, com direito à ampla defesa.


Boa tarde procês, beijos.

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Nunca não leia os comentários!



Contrariando o décimo primeiro mandamento da lei de Deus, fui ler os comentários de uma notícia da Folha (https://www.facebook.com/photo.php?fbid=678973948811278) e me deparei com milhares de bilhões de comentários do tipo "Sinto dó pelo pai, não pelo preso".

Perguntei-me: qual foi o crime cometido pelo rapaz, que consta na matéria? Posse ilegal de munição. Fato é que não dá pra saber o que mais o rapaz fez, ou ainda, se é que de fato fez (sabemos que falsos flagrantes são bastante comuns), e os comentaristas acham justo um rapaz de 21 anos tomar 180 facadas e ser decapitado porque portava ilegalmente munição?!

Aí você poderia questionar: "O que ele iria fazer com essas munições? Substituir as bombinhas da festa de São João? Ou caçar lagartixa no estilingue igual Chávez?"

Respondo: Não dá pra saber. O que não dá pra fazer é presumir que o rapaz seria um psicopata potencial que matou ou mataria vários e baseando-se nisso julgá-lo culpado sem direito de defesa e processo, bem como a condenação por pessoa competente, etc, e assim consequentemente visualizar sua morte como "justa". Lembrando que Pedrinhas é um CDP, Centro de Detenção Provisória, onde hipoteticamente estão os presos ainda não condenados, os que aguardam julgamento (Carandiru, mais de uma centena de mortos, oi?).

"Agora me diga, porque ele foi esfaqueado ? Por que ele mais aqueles dois?", você poderia novamente questionar.

Respondo novamente: São tantas as possibilidades... Pode ser que eram simplesmente os mais "acessíveis" "integrantes" de uma facção rival. E por que "integrantes", em aspas? Porque existe coação destes grupos aos novos presos para "associação". Uma entre bilhões e bilhões de possibilidades. Pode ser que eram os chefões da outra facção. Não dá pra saber, logo, não dá pra achar que tenha sido justo.

Todo mundo sabe que o Estado brasileiro é ineficiente nas mais diversas áreas (senão todas). Mas chega na área da justiça e do tratamento da polícia com os "bandidos" que a opinião pública muda completamente pra 100% de eficiência. Não é assim que a banda toca. É muito mais comum do que se imagina a prisão e condenação de inocentes ou aqueles nem tão culpados assim. Principalmente no que diz respeito à prisão. Por isso que existe um processo, meios de eventualmente se provar inocência, "liberdade provisória" - sempre ultra-criticada e vista como um entrave à "justiça".

Mesmo com condenação e CONFISSÃO (confissão, isso mesmo - não são raros os casos de condenados confessos que se descobriu a inocência depois). E aí, num caso desses, como faz? E se esta for uma prisão nem tão correta assim? Como se reverte a morte? Indenização de 15 mil pra família?

Ao contrário da opinião majoritária no cosmos, os institutos jurídicos e direitos humanos não servem pra "proteger bandido". O que se visa proteger são os inocentes, e assim, a própria justiça. São aproximadamente 4.000 anos de evolução destes institutos, contando desde Hamurabi. Não menosprezemos assim tão facilmente as razões de existir de certos "entraves da justiça" e "liberdades provisórias" e busquemos compreendê-los e refletir sobre, antes de criticarmos. Os bilhões de seres humanos inocentes mortos nos agradecem, inclusive um, creio talvez hipotético, que muita gente é fã - e não seguidor, de fato- , que foi pregado numa cruz e cujo único crime era dizer "Amai-vos uns aos outros".

Postado inicialmente na SR:
https://www.facebook.com/sociedaderacionalista/posts/726814030662443

Um abraço!